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O alto índice de rejeição de Lula na última pesquisa CNT/Sensus; a queda do PIB no
último trimestre e a cassação de José Dirceu somam-se para reforçar a posição dos que
defendem a idéia de que, mesmo com tudo o que já se descobriu sobre o esquema de
corrupção montado pelo PT - e os oposicionistas não se cansam de repetir que Lula é o
chefe e sabia de tudo - é melhor deixar Lula sangrar no cargo para derrotá-lo nas urnas.
O argumento para defender essa posição é o de que, derrotado nas urnas, Lula estará
definitivamente liquidado e os petistas jamais poderão usar em seu favor o argumento de
que o impeachment teria sido um golpe da direita preconceituosa contra o presidente
operário.

Ou seja, mesmo considerando que Lula tem responsabilidade sobre a corrupção sob seu
governo, e mesmo tendo cassado José Dirceu por essa razão, a oposição, com apoio de
importantes setores da mídia e do empresariado, decidiu não remover Lula do poder pelo
democrático processo de impeachment. O assunto desapareceu do noticiário e do colunismo
político. Nenhum instituto de pesquisa pergunta ao povo se Lula merece ou não ser
impichado.

Quando o presidente da República era Collor, no entanto, não foi isso que se viu. Pelo
contrário, em determinado momento Collor ficou isolado e foi cercado por uma santa-
aliança que colocou na mesma trincheira, o PT e a forças sociais que lhe dão (ou davam)
sustentação (Igreja, ONGs, sindicatos, etc.); a mídia, a nata do PIB, as Forças Armadas,
a elite dos partidos tradicionais e quem mais possa se imaginar que não tivesse
carteirinha de sócio da chamada "república das alagoas". O pretexto para o impeachment
de Collor foi a corrupção, o que, a rigor, também justifica o impeachment de Lula. O
julgamento que determina o impedimento de um governante é político, como defendiam os
petistas à época. Ao contrário daquilo que dizem hoje ao alegarem que José Dirceu foi
cassado sem provas e que Lula não deve ser cassado.

Se as situações de Collor e Lula se assemelham e se os pretextos para a cassação de um e
outro são análogos, como se explicam as barreiras invisíveis ao impeachment de Lula?

A primeira explicação está na conveniência do PSDB e do PFL. Tucanos e pefelistas
calculam que, se a correnteza seguir na direção que vai, o trono de Lula fatalmente está
destinado a encaixar-se sob suas nádegas. Isto é, PSDB e PFL precisam de Lula lá, como o
diabo precisa da cruz (ou seria o contrário?) para existir.

Mas, há outra explicação menos óbvia subjacente à lógica dos acontecimentos. A
comparação entre as situações de Collor e Lula é o que permite desvendar esse mistério.
Afinal, se corrupção apenas fosse motivo para remover governantes do poder, o Brasil
integraria o Guinness Book of Records de impeachments e cassações.

A corrupção foi o pretexto para cassar Collor, mas os reais motivos políticos para
removê-lo do poder foram os interesses que ele contrariou. Não me entenda mal, leitor.
Não pretendo anistiar Collor. Aliás, quem deveria anistiá-lo e devolver-lhe o cargo é
José Dirceu e sua turma, com essa conversa sobre a falta de provas. Mas isso é outro
assunto. É consenso entre analistas que foi Collor quem inaugurou a agenda da
modernização da economia e do Estado no país. Goste-se ou não dele, foi por sua
iniciativa que a agenda de reformas liberalizantes é aplicada no Brasil desde o início
dos anos 90, não obstante os sucessivos presidentes de perfis políticos-ideológicos e
pessoais distintos que têm se revezado no poder. E sob que circunstâncias Collor chegou
ao poder, governou por dois anos e começou essas reformas?

Em primeiro lugar, a candidatura Collor foi "adotada" pelo establishment, sob o pavor de
que o então "bicho papão", Lula, sucedesse Sarney. Para vencer, Collor usou o PRN, cuja
bancada federal era de 16 deputados. O ex-enfant terrible das noites brasilienses elegeu-
se sem fazer concessões aos partidos tradicionais da política brasileira. Ao montar seu
ministério, Collor fechou-lhes a porta do poder. Como diria Roberto Jefferson, ficaram
no gargarejo como filhotes de passarinho piando excitados e famintos, a espera de que a
mãe lhes botasse o alimento na boca. E Collor, nada.

Em segundo lugar, Collor fechou empresas estatais na canetada, e, na impossibilidade de
demitir funcionários públicos estáveis por desígnio constitucional, mandou milhares
deles para casa, recebendo apenas o soldo básico, sem as gordas gratificações e
privilégios adquiridos que terminam quadruplicando, senão mais, seus contracheques.

Em terceiro lugar, estávamos saindo da era pós-cruzado. A hiperinflação levara à CUT às
ruas reivindicar 147% de aumento das aposentadorias. E Collor negou-se a aumentá-las até
o último dia de seu breve mandato. Não havia lugar onde Collor pusesse os pés que não
fosse recebido por uma horda de velhinhos teatralmente instrumentalizados pelo PT e pela
CUT para infernizar o precursor de Berzoini na arte de infernizar aposentados.

Em quarto lugar, Collor extinguiu o SNI, sepultou o projeto nuclear-militar brasileiro e
estrangulou o orçamento das Forças Armadas, como parte de sua política de saneamento das contas públicas e obediência às exigências da comunidade internacional sobre questões de uso militar da energia nuclear.

Em quinto lugar, Collor começou a abrir a economia brasileira aos investidores
internacionais, impondo às empresas aqui instaladas - mal acostumadas à proteção estatal
e a lucrar com a inflação, e cujos donos haviam patrocinado sua eleição - a necessidade
de enfrentar, em condições desfavoráveis, os competidores agressivos da economia
globalizada.

E, se a memória não me trai, em sexto e último lugar, Collor - dono das organizações de
mídia Arnon de Mello - em parceria com o falecido José Carlos Martinez, ex-presidente do
PTB e proprietário de Rede Gazeta do Paraná, tinha intenção de comprar a falida Rede
Manchete, para montar uma rede de telecomunicações e tentar desbancar a hegemonia da
Rede Globo (que havia apadrinhado sua chegada ao poder) nesse mercado.

Aí foi demais. Collor conseguiu a proeza de unir contra si: a Rede Globo; a nata do PIB;
as Forças Armadas; os partidos políticos tradicionais; a mão invisível do estamento patrimonialista, liderada pelas corporações sindicais do funcionalismo público; a
esquerda; a sopa de letrinhas que gravitava em torno do PT (CNBB, CUT, UNE, OAB, ABI, etc.). Essa santa-aliança, manipulando imbecis de caras pintadas e velhinhos indignados, foi quem apeou o jovem pretensioso e arrogante do poder. Só mesmo um ex-adolescente brasiliense que passara a juventude aprontando impunemente nas noites entorpecentes da capital federal, para imaginar que conseguiria trombar de frente com 500 anos de patrimonialismo sem pagar o preço da ousadia.

Frente a esse breve inventário do impeachment de Collor, pergunto: O interesse de quem
Lula está contrariando? De ninguém relevante. Enquanto não contrariar os interesses dos
integrantes da seleta lista acima - e o interesse do capital financeiro - Lula não corre
risco de impeachment. No máximo, esse governo contraria os interesses eleitorais do PSDB
e do PFL, que avaliam ser os herdeiros naturais do trono nas urnas de 2006. E, é claro,
a visão de mundo de uma minoria de brasileiros (e bota minoria nisso), que preza os
direitos individuais, a democracia e a liberdade, e entende que, na cabeça de gente como
José Dirceu e Lula escondem-se perigosos sonhos totalitários que, se possível, devem ser
mantidos sob confinamento eterno, no mundo dos devaneios stalinistas do petismo.

Fonte: Por Paulo G. M. de Moura